Dom Beto Breis| Arcebispo Metropolitano
A Quaresma deste ano re-veste-se de uma marca toda especial: estamos no Ano Jubilar da Redenção. Aquele que por amor fez-se humildemente nosso irmão, encarnando-se, na surpresa desconcertante da Cruz “amou-nos até o fim! ” (João 13,1). Desde quando desceu ao seio da Virgem até a morte escandalosa no Madeiro amou-nos, por vezes enfrentando escribas e fariseus hipócritas e de corações empedernidos (de pedra) por causa do seu jeito de des-velar a Misericórdia do Pai. E convidou-nos a amar como Ele amou
E é por sermos movidos pela certeza de que somos amados e que a Cruz não é sinal de fracasso, mas da força estupenda e redentora do Amor, que devemos propor-nos a cor-responder à flama ardente do Coração de Deus. CON-VERSÃO, apelo irreprimível destes quarenta dias de Retiro, é mudança de mentalidade e de agir conformando-os sempre mais à fé no Evangelho. Foi o que ouvimos quando foram impostas sobre nós as cinzas no início desse itinerário Quaresmal: “Convertei-vos e crede no Evangelho”. E a conversão tem duas dimensões intrinsicamente relacionadas: a pessoal e a comunitária.
Parece-nos, pois, estranho que alguns irmãos por vezes agressivos e em tom beligerante, atacam veemente e sistematicamente a Campanha da Fraternidade, uma iniciativa de seis décadas na Igreja do Brasil que a cada ano apresenta uma realidade concreta a desafiar os discípulos de Jesus neste Tempo Litúrgico de mudança de vida que é a Quaresma. Alucinam-se propagandeando uma conversão dissociada da caridade, dom supremo do Espírito (cf. 1 Cor 13,13) e da atenção aos clamores da Terra e dos pobres. Em postagens ruidosas e em comentários arrogantes alardeiam que conversão ecológica (expressão de São João Paulo II) e Ecologia Integral em nada tem a ver com a penitência e conversão propostas pela Igreja no caminho até a Páscoa.
Parece-nos sugestivo que no centro do cartaz da CF deste ano aparece o Pobrezinho de Assis. A cortesia daquele que iniciou um caminho permanente de conversão a partir do encontro com o des-figurado e des-cartado leproso (como o atesta no início do seu Testamento) se estendeu numa relação de ternura e cuidado com toda a Criação, na qual re-conhecia com ad-miração os vestígios do Criador. No Cântico das Criaturas, composto há 800 anos, São Francisco de Assis, já cego dos olhos e na proximidade do encontro com a irmã morte, expressa de forma encantadora a con-fraternização e interação com todas as Criaturas e uma decisiva contestação ao dualismo radical dos membros do Movimento Cátaro (grave heresia da época). A propósito, a palavra Cátaro vem do grego καϑαρός e significa “puro”. Tratava-se de um movimento penitencial que des-prezava tudo o que é material e visível, atribuindo sua origem ao Diabo.
“Neo-cátaros” do nosso tempo (que por vezes se intitulam puros em perfis nas redes sociais) ferem a unidade na diversidade com suas dicotomias anacrônicas e ataques ao Papa Francisco e aos bispos do Brasil em sua colegialidade expressa pela CNBB. Bem lembram aqueles que criticavam Jesus e não o escutavam, diferentemente dos pecadores, como apresentava o excerto evangélico desse IV Domingo da Quaresma (Lucas 15,1-2). Enquanto uns seguiam Jesus para tomar um rumo novo, os simulados per-seguiam o Mestre!.
Que neste Tempo Favorável deixemo-nos interpelar pelo Crucificado e busquemos verdadeira e firmemente a conversão do coração, pois aí está de onde procedem todas as ações na relação com o Senhor, com os irmãos e com as criaturas.